Em 22 de agosto de 2003, o Brasil se preparava para fazer o primeiro lançamento espacial direto da Base de Alcântara, norte do Maranhão. Batizada de “Operação São Luís”, em referência à capital do estado, a missão nunca foi concluída. Naquele dia, uma explosão matou 21 técnicos e engenheiros e transformou o que seria um importante passo tecnológico brasileiro em tragédia.
O objetivo da Operação São Luís era colocar em órbita o satélite meteorológico Satec, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), e o nanossatélite Unosat, da Universidade do Norte do Paraná (UENP).
Registros indicam que o Veículo Lançador de Satélites (VLS), foguete que levaria o primeiro satélite de fabricação nacional para o espaço, passava por ajustes finais na Torre Móvel de Integração (TMI), quando uma ignição prematura de um dos motores resultou na explosão do protótipo de 21 metros de altura.
A causa apontada pelo relatório final de investigação, concluído pelo Comando da Aeronáutica, em fevereiro de 2004, foi um “acionamento intempestivo” provocado por uma pequena peça que ligava o motor.
Na época, as autoridades federais descartaram a possibilidade de sabotagem, de grosseira falha humana ou de interferência meteorológica. Por outro lado, apontaram “falhas latentes” e “degradação das condições de trabalho e segurança”, como saídas de emergência que levavam para dentro da própria TMI, além de estresse por desgaste físico e mental dos tecnologistas.
Os parentes das vítimas foram contemplados com uma indenização aprovada por uma lei proposta pelo Poder Executivo. Na época, ficou determinado que haveria o pagamento de uma parcela única não inferior a R$ 100 mil a cada uma das famílias. Ficou estabelecida, também, uma bolsa de R$ 400 por mês para custear os estudos dos dependentes das vítimas até completarem 24 anos.
Recuperação do Centro de Lançamento
A nova TMI, com 33 metros de altura e 380 toneladas, só foi inaugurada em 2012. No período, desde a explosão, foram investidos pouco mais de R$ 582 milhões em infraestrutura e sistemas para o Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), segundo informou, à época, o então presidente da Empresa Espacial Brasileira (EAB), José Raimundo Coelho.
A partir da explosão, as atividades no CLA foram recuperadas. Outros lançamentos de foguetes ocorreram com o passar do tempo, a exemplo de 2010, com o sucesso do foguete brasileiro de médio porte VSB-30 V07. A aeronave levou ao espaço experimentos de universidades, de institutos de pesquisas e de alunos a uma altitude de 241,9 mil km.
Já em novembro 2015, um foguete suborbital explodiu na plataforma de lançamento devido a uma falha no motor. O veículo, ainda na rampa de lançamento, nem chegou a decolar. Não houve mortos nem feridos.
O foguete fazia parte da “Operação São Lourenço” com o objetivo de testar o Satélite de Reentrada Atmosférica (SARA), destinado a experimentos no espaço para o desenvolvimento de produtos nas áreas de engenharia e eletrônica. Na fase final, pesquisadores brasileiros realizariam estudos científicos e tecnológicos por até dez dias em ambiente de microgravidade.
Fracasso com a Ucrânia
Outro momento frustrante do CLA diz respeito ao acordo entre Brasil e Ucrânia para o uso da Base de Alcântara no lançamento de satélites comerciais. Os dois países chegaram a criar a empresa binacional Alcântara Cyclone Space (ACS), mas o projeto foi sepultado em 2019 por inviabilidade tecnológica-comercial. Nesse período, nenhum lançamento foi concluído.
Parceria com os EUA
Em 2020, o Brasil promulgou um Acordo de Salvaguardas Tecnológicas entre o Brasil e Estados Unidos, o que permite aos americanos a exploração da Base de Alcântara para lançamentos espaciais. O tratado, porém, não prevê a transferência tecnológica para o território brasileiro.
O principal objetivo do acordo é proteger a tecnologia dos EUA e Brasil contra o uso ou cópia não autorizados. Na época, a AEB informou que, sem a assinatura do acordo, nenhum satélite de origem americana poderia ser lançado da base de Alcântara, pois não haveria a garantia da proteção da tecnologia patenteada por aquele país.
O acordo foi assinado em março de 2019, em Washington, mas teve que passar pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal para ser validado. Somente em 2020, o tratado foi promulgado.
1º lançamento comercial
Em março desde ano, a Base de Alcântara lançou o primeiro foguete comercial, numa parceria inédita com uma empresa privada estrangeira. O voo experimental, não tripulado e de 4 minutos e 33 segundos, do foguete sul-coreano HANBIT-TLV, da InnoSpace, levou uma carga útil 100% desenvolvida no Brasil.
O foguete levou, como carga útil, um Sistema de Navegação Inercial do tamanho aproximado de um celular, essencial para testes em navegação autônoma de foguetes.
Localização estratégica
O CLA é tido como um dos melhores pontos de lançamento de foguetes do mundo, devido à localização estratégia próxima à Linha do Equador. A posição aproxima o veículo espacial à órbita da Terra, o que reduz o consumo de combustível.
Além das condições geográficas, outro ponto positivo que pesa sobre a região diz respeito ao baixo tráfego marítimo e aéreo. Isso garante maior segurança e proteção de civis, pois a região não é em área residencial.