A Justiça do Maranhão determinou, a pedido do Ministério Público Federal (MPF), o bloqueio de R$ 78 milhões das contas dos Fundos de Saúde de 20 municípios maranhenses. O motivo são indícios de recebimento fraudulento de repasses federais de emendas parlamentares. Estão incluídos aí, valores das emendas de relator – o chamado orçamento secreto.
Na lista de cidades que tiveram as contas bloqueadas, estão Miranda do Norte, Afonso Cunha, Bela Vista do Maranhão, São Francisco do Maranhão, Loreto, Governador Luiz Rocha, Santa Filomena do Maranhão, São Bernardo, Igarapé Grande, Bequimão, Turilândia, Lago dos Rodrigues, Joselândia e São Domingos do Maranhão. Os nomes das demais cidades não foram informados pelo MPF.
Segundo o MPF, o pedido de bloqueio das contas se deve à existência de indícios de irregularidades na inserção de dados falsos em sistemas do Sistema Único de Saúde (SUS), com o objetivo de desviar as verbas parlamentares, que são recursos públicos.
O orçamento secreto surgiu com a criação de uma nova modalidade de emendas parlamentares, que são recursos do orçamento da União, direcionados por deputados para suas bases políticas.
Operação
Na sexta-feira (14), dois irmãos foram presos no Maranhão por participação no esquema verificado em Igarapé Grande, em decorrência da Operação Quebra-Ossos, da Polícia Federal. Também são investigadas outras seis pessoas e quatro empresas.
Na mesma operação, a Justiça determinou o bloqueio de R$ 57 milhões em bens dos investigados. Os nomes dos demais investigados não foram divulgados. O g1 tenta contato com Roberto e Renato Rodrigues, além dos demais investigados, mas não teve retorno até a publicação desta reportagem.
Esquema
De acordo com a investigação, que começou há três meses, o esquema fraudulento se inicia com a inserção de dados falsos a respeito dos procedimentos médicos realizados em municípios maranhenses nos sistemas de dados do SUS, como o Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA) e o Sistema de Informações Hospitalares (SIH).
Com isso, o limite para o recebimento de repasses é repentinamente aumentado por conta dos dados indevidos, possibilitando que os recursos sejam repassados muito acima do valor realmente devido. A suspeita é que esses valores a mais eram posteriormente desviados de sua destinação legal, por meio de fraudes em contratos com empresas.
Em análise preliminar da Controladoria Geral da União (CGU), foi constatado que a produção ambulatorial informada pelos municípios maranhenses cresceu 78% nos últimos cinco anos, mas não houve aumento na quantidade de instalações e contratação de médicos e demais profissionais de saúde.
Fraude
Em um dos pedidos, o MPF demonstrou que o município de Miranda do Norte tinha, em 2020, uma produção ambulatorial de média e alta complexidade de R$ 330 mil.
No entanto, em 2021, o valor saltou para R$ 9,3 milhões – sem qualquer crescimento aparente das instalações e contratação de médicos –, o que possibilitou o recebimento de emenda parlamentar de R$ 10 milhões em 2022, sendo R$ 1,5 milhão provenientes de emenda de relator.
O município informou ao Ministério da Saúde que, em 2021, foram realizadas 900 mil consultas de médico em atenção especializada. A cidade de Miranda do Norte tem apenas 29 mil habitantes e 8 médicos; para alcançar este número de consultas, cada médico deveria ter realizado 450 consultas por dia. Por esse motivo, em ação cautelar proposta pelo MPF, foram bloqueados judicialmente R$ 9,3 milhões do Fundo Municipal de Saúde (FMS) do município.
Já no município de Afonso Cunha, no qual o bloqueio judicial foi de R$ 6,6 milhões, informações falsas foram inseridas nos sistemas do SUS nos anos de 2020 e 2021, segundo o MPF. Foi informado, por exemplo, que teriam sido realizadas 30 mil ultrassonografias de próstata nesse período, número que corresponde a cerca de 4 vezes a população do município, que atualmente é de 6.700 habitantes.
Por sua vez, São Francisco do Maranhão, com apenas 12 mil habitantes, informou que teria realizado cerca de 300 mil consultas médicas de atenção especializada nos meses de novembro e dezembro de 2021, o que corresponderia, a 25 consultas por habitante em um período de dois meses. Ação cautelar proposta pelo MPF conseguiu o bloqueio de R$ 1,9 milhões do município.