O Brasil dá sinais de um colapso em seu sistema de saúde. Mais que isso: segundo a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o país passa pela maior crise sanitária e hospitalar da história. Pacientes morrem na fila à espera de um leito de UTI, hospitais alertam para a falta de insumos e até mesmo as funerárias falam em cancelar as férias de funcionários.
“O Brasil já colapsou”, afirma em entrevista ao G1 Gonzalo Vecina, médico sanitarista e professor da Faculdade de Saúde Pública da USP. Em São Paulo, estado que tem a maior estrutura hospitalar do país, antes do fim de março, morreram pelo menos 135 pessoas à espera de uma vaga na UTI.
No Paraná, o número foi ainda maior: foram 500 mortos aguardando a disponibilidade de leitos de UTI e enfermaria, segundo o governo do estado. Até sexta-feira (19), 1.196 paranaenses aguardavam por uma vaga. “Nós vamos ter diferentes situações no Brasil”, diz Vecina. “Alguns vão conseguir controlar, outros não. Sem isolamento, a única saída seria aumentar o número de leitos, mas é muito difícil acertar a demanda.”
Professor da Universidade de Duke (EUA), o neurocientista Miguel Nicolelis disse em entrevista ao jornal “O Globo” que, antes de se esgotar, uma taxa de ocupação de 90% dos leitos de UTI já é preocupante. “Só na logística para achar o leito e transferir, as pessoas vão morrer. O Brasil inteiro colapsou”, disse Nicolelis.
As secretarias da Saúde, centrais de regulação, hospitais, prefeituras e Defensoria Pública analisaram a situação dos leitos da UTI. Em ao menos 16 estados, já houve mortes de pacientes com Covid-19 ou com suspeita da doença na fila por uma vaga. No Rio Grande do Norte, por exemplo, segundo a Central de Regulação, 156 óbitos foram registrados neste ano.
Falta de insumos
Hospitais e entidades médicas também alertam para a falta de medicamentos usados na entubação de pacientes graves de Covid-19. Neste sábado (20) a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou uma série de medidas emergenciais para evitar o desabastecimento.
O Ministério da Saúde chegou a requisitar mais de 665 mil medicamentos de um dos maiores fabricantes do país após prefeitos e governadores alertarem o governo federal sobre a escassez de produtos diante do aumento na quantidade de pacientes com Covid-19 internados nos hospitais.
Um levantamento feito pela Frente Nacional de Prefeitos (FNP) indicou que o oxigênio destinado a pacientes de Covid-19 está prestes a acabar em pelo menos 76 municípios de 15 estados. Já a Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) disse que só tem medicamento para mais 4 dias.
Falha no abastecimento de oxigênio
Outras situações críticas têm sido verificadas pelo Brasil. No Rio Grande do Sul, pelo menos seis pessoas morreram depois de uma falha no fornecimento de oxigênio, segundo o governo do estado. Um hospital da Região Metropolitana de Porto Alegre registrou “instabilidade na distribuição do oxigênio” por cerca de 30 minutos.
Todos os pacientes tinham Covid-19, mas a instituição diz não ser possível determinar se as pessoas morreram pela falta do oxigênio. No momento da falha, 26 pessoas recebiam ventilação mecânica.
Na maior cidade do país, dez pacientes precisaram ser transferidos com urgência depois de um problema no fornecimento de oxigênio durante a madrugada deste sábado. Segundo a Secretaria da Saúde de São Paulo, houve atraso na entrega do gás e, por conta disso, o município “transferiu pacientes por segurança”, mas o fornecimento já foi normalizado.
Faltam caixões, funerárias sem férias
Por conta do alto número de mortes – apenas na última semana, foram mais de 2 mil a cada dia – as funerárias vêm encontrando problemas com a possível falta de materiais para a produção de caixões. A Associação dos Fabricantes de Urnas do Brasil (Afub) disse que aumentou sua produção em 20% neste ano, mas vem enfrentando dificuldades para comprar matéria-prima – madeira serrada e compensada.
Há recomendação da Associação Brasileira de Empresas e Diretores do Setor Funerário (Abredif) pediu a suspensão temporária das férias de funcionários do setor diante do aumento de mortes. Entre as medidas, além da suspensão de férias pelos próximos 60 dias, está a recomendação de que se mantenha um estoque dos materiais para sepultamento três vezes maior do que o necessário para o atendimento em um mês comum.
Outro sinal do alto número de mortes foi registrado nas portas de um cartório do Rio Grande do Sul, onde uma fila foi formada em frente ao registro de óbitos – que passou a atender em horário ampliado.